Eu tive a sorte de conviver com pessoas que, mesmo sem perceberem, acordavam todos os dias querendo crescer. Não só elas: toda equipe, acredito, tem potenciais líderes que só precisam de estímulo, espaço e apoio. Ainda assim, transformar colaboradores em líderes é um desafio que nem todo gestor quer enfrentar de verdade. Requer coragem, paciência e, principalmente, disposição para aprender junto. Mas, afinal, como identificar, estimular e desenvolver essas novas lideranças sem deixar a cultura da empresa de lado?
Entendendo liderança na prática
Nas minhas experiências, encontrei vários equívocos sobre o que é ser líder. Um dos erros mais comuns é confundir autoridade com liderança. Ser líder não é simplesmente ocupar um cargo. Não é receber um título e pronto, acabou. Liderança vai muito além de coordenação técnica ou tempo de casa.
O verdadeiro líder inspira, influencia e apoia os outros de maneira natural. Ele abre caminhos, faz perguntas que desafiam a equipe e está disposto a dividir responsabilidades. Gostaria de destacar uma frase que ouvi certa vez e nunca esqueço:
Líder é quem faz os outros quererem crescer ao redor.
Esse espírito é raro, mas quando surge precisa de nutrição constante. Não basta nomear alguém: é preciso criar cenários onde as pessoas sintam que podem, de fato, liderar.
O primeiro passo: criar cultura que valorize a liderança
Antes de pensar em treinamentos ou promoções, é preciso olhar para o clima da equipe. Eu percebo que equipes que têm medo de errar, que sentem que seus esforços são ignorados ou que enxergam a liderança como um privilégio distante, dificilmente vão revelar novos líderes.
- Franqueza nas discussões
- Abertura para ideias diferentes
- Reconhecimento sincero
- Espaço para aprendizado (inclusive para errar)
Esses componentes, quando praticados diariamente, criam o terreno fértil para líderes se desenvolverem. Só depois, então, é possível pensar nos próximos passos.
Como identificar potenciais líderes?
Nem sempre quem fala mais alto ou entrega mais rápido é o que tem mais potencial. Ao longo dos projetos que acompanhei, percebi que as características abaixo indicam grande chance de crescimento em alguém:
- Curiosidade natural, vontade de entender o “porquê” das coisas
- Capacidade de ouvir propostas e críticas sem se fechar
- Proatividade: aquela pessoa que, mesmo sem pedir, já se antecipa
- Visão do coletivo, ao invés de só olhar para si
- Autonomia aliada à responsabilidade
Às vezes, quem menos espera surpreende. Já vi colaboradores quietos demonstrando grandes ideias em situações caóticas, por exemplo. E penso que não existe uma fórmula, mas sim sensibilidade do gestor para observar de perto essas particularidades.
Erros clássicos ao tentar formar líderes
Eu já fui vítima e também responsável por alguns desses tropeços. Acho saudável assumir isso, então listo os deslizes mais comuns que já testemunhei:
- Pular etapas, promovendo alguém por pressão de prazo ou favoritismo
- Esperar perfis “iguais ao meu”, sem aceitar estilos diferentes de liderança
- Focar só no lado técnico, esquecendo relacionamento humano
Preparar um líder requer paciência para aceitar falhas no processo. Às vezes, mesmo depois de todo o planejamento, a pessoa não se adapta – e tudo bem. O ciclo tem que ser natural, jamais forçado.
Dando os primeiros desafios
Quando percebo que alguém tem potencial, costumeiramente proponho desafios intermediários, nunca um projeto “de cara”. Já vi isso dar errado quando alguém recém-promovido acaba sobrecarregado, sentindo-se desamparado e desmotivado.
O caminho mais seguro, para mim, é o seguinte:
- Delegar tarefas de baixa complexidade (mas com visibilidade e impacto)
- Permitir que participe de reuniões estratégicas, como observador
- Solicitar opiniões em temas relevantes
- Monitorar reação a críticas e sugestões
Com pequenas doses de autoridade, a pessoa vai sentindo, de fato, como é estar em posição de liderança.
A importância do feedback (muito além do “parabéns”)
Às vezes, penso que o feedback ainda é subestimado no processo de formação de líderes. Ele precisa ser sincero, imediato e construtivo. Falar “você foi bem” ou “precisa melhorar” é só o começo. Gosto quando perguntas abertas surgem, como:
- O que você teria feito diferente?
- Quais pontos você percebeu que a equipe reagiu bem?
- Em que situação você se sentiu menos seguro?
Esse tipo de abordagem permite que o colaborador enxergue seus próprios pontos de ajuste, sem se sentir julgado. E já posso garantir que é um passo gigante para o autoconhecimento, peça-chave para qualquer liderança sustentável.
Inclusive, trouxe para o time uma sugestão que apareceu neste artigo sobre perguntas que todo líder deve fazer em reuniões semanais. O impacto das questões certas no momento certo é surpreendente, pelo menos no que vi em minha trajetória.
Como preparar um ambiente seguro para tentativas, erros e acertos?
Uma cultura de aprendizado real não pode ser pautada pelo medo. Em algumas experiências, reparei que equipes que tinham medo de retaliação, fofoca ou punição direta evitavam propor soluções, mesmo as mais simples. Moldar o ambiente para que todos possam experimentar, errar e ajustar faz parte do caminho do líder. Isso me leva a algumas ações que adotei depois de apanhar bastante:
- Valorizar erros tratáveis, se houve aprendizado, valeu a pena
- Criar espaços para compartilhar experiências e debates sem julgamento
- Estimular o registro de aprendizados, para consulta futura
- Reconhecer quando alguém assume posição de vulnerabilidade
Errar não é o fim. É o começo do aprendizado.
Esse raciocínio muda completamente o jogo. A resistência diminui, e o desejo de fazer melhor aparece.
Treinamento contínuo e empoderamento
Eu sou entusiasta da ideia de que aprender nunca é perda de tempo. Se posso sugerir algo, é: invista em treinamentos, inclusive não convencionais. Workshops, cursos curtos, sessões com profissionais externos, mentorias e até eventos informais de troca sempre trouxeram resultado positivo não apenas na performance, mas especialmente no engajamento do time.
Dinâmicas de formação de líderes
Algumas dinâmicas, por exemplo, ajudam a romper o gelo:
- Debates simulando situações de conflito
- Apresentações de cases reais, explicando decisões tomadas
- Troca de funções por um dia
- Rodas de conversa sobre fracassos (sim, fracassos!)
No começo, sempre existe hesitação, mas com o tempo, as pessoas sentem mais liberdade para compartilhar e evoluir.
Mentoria: case de aprendizado duplo
Lembro com carinho do caso em que propus mentoria interna entre colaboradores da mesma equipe. O objetivo era simples: fazer os mais experientes orientarem quem demonstrava potencial. O resultado surpreendeu. O mentor ganhou novas habilidades de orientação, e o “mentorando” se sentiu confiante para buscar mais espaços na rotina.
Delegar de verdade: resistir ao impulso de controlar tudo
No início da minha trajetória como gestor, eu tinha dificuldade em delegar. Grande erro. Delegar não é apenas passar tarefas, mas confiar que o colega fará do próprio jeito. Isso significa abrir mão do controle minucioso. Para quem está iniciando, pode ser desconfortável, eu sei. Um conselho pessoal: combine expectativas, mas depois observe à distância. Deixe a pessoa assumir riscos calculados, até porque, se tudo sair sempre conforme o esperado, talvez pouco esteja sendo aprendido.
Comunicação clara: o segredo para autonomia
Gosto de reforçar: clareza nos objetivos e feedbacks. Evite suposições ou orientações pela metade. E nunca parta do princípio que o outro já entende tudo que você pensa. Quando a comunicação é transparente, até mesmo tarefas delicadas são assumidas com mais confiança.
Delegar é confiar, não testar a pessoa.
Eu, sinceramente, demorei para aprender isso. Mas faz sentido.
Como garantir que o novo líder engaje o time?
Vi muitos líderes iniciantes perderem a mão porque queriam copiar gestos ou posturas antigas do gestor. O time percebe, e a conexão se quebra rápido. Ajudo sempre compartilhando experiências sobre como inspirar a equipe e ser um líder mais eficaz. Acho que autenticidade tem valor inegociável.
- Encoraje o novo líder a compartilhar aprendizados e também dúvidas com o grupo
- Dê abertura para o acolhimento de sugestões da equipe
- Recomende, se possível, a participação em atividades conjuntas que promovam diversidade de pensamento
Engajamento de verdade nasce quando o colaborador sente que sua opinião pesa na decisão final.
Já existem dicas interessantes para quem quer focar no engajamento e retenção, explorei algumas das ideias deste conteúdo sobre engajar e reter talentos em equipes. Com pequenas adaptações, funciona muito bem para líderes em formação.
Monitorando, celebrando e ajustando a rota
Depois que o colaborador assume papel de liderança, muita gente relaxa acreditando que “missão cumprida”. Eu penso diferente. Essa transição exige acompanhamento próximo, mas sem microgerenciamento. Talvez você prefira monitorar métricas de performance, enquanto eu pessoalmente acho mais eficaz conversar, ouvir feedbacks da equipe direta e observar a atmosfera do grupo.
É nesse ponto que celebro pequenas conquistas.
Vitórias diárias, mesmo pequenas, merecem ser comemoradas.
Isso cria senso de progresso e coloca menos pressão sobre o novo líder.
Quando há desequilíbrios, sejam eles de relacionamento, resultados ou motivação, prefiro chamar para uma conversa franca, sem público. Ajustar honestamente é melhor do que mascarar situações problemáticas. O ciclo líder-equipe pede ajustes constantes. Uma comparação que vejo muito é a de um maestro: o som nunca será perfeito sem pequenos ajustes de tempo em tempo, concorda?
A influência do exemplo: o que você faz fala mais alto do que o que você fala
Há quem subestime o impacto de uma postura inspiradora nas chefias. Eu já vivi situações onde as pessoas reproduziam comportamentos negativos sem perceber, apenas porque viam seus líderes fazendo igual. O exemplo, não importa o nível hierárquico, molda a cultura e direciona comportamentos futuros.
Às vezes, trata-se de pequenas atitudes: humildade ao admitir um erro, rigor ao cumprir um prazo, respeito ao dialogar com todos de maneira igual. Isso cria onda positiva e, com o tempo, transforma potenciais líderes em agentes multiplicadores de boas práticas.
Liderança distribuída: o futuro que já começou
O modelo antigo de um único líder para muitos seguidores começa a perder força. O que tenho percebido em equipes de alto desempenho é a distribuição natural da liderança. Ela se manifesta em diferentes momentos, conforme a habilidade ou experiência de cada um. O segredo do gestor, hoje, é incentivar que todos possam exercer pequenas formas de liderança em seu contexto.
- Responsabilidade rotativa por projetos
- Tarefas multidisciplinares, com subgrupos liderados por diferentes membros
- Incentivo a grupos de discussão independentes
Isso amplia a confiança coletiva uma das maiores riquezas de qualquer organização.
O papel do líder de líderes
Chegando até aqui, é impossível não mencionar o papel de quem forma líderes. Eu já vi gestores que ficavam apreensivos de criar alguém capaz de superá-los. Entendo esse temor, mas discordo dessa postura: bons líderes querem criar outros líderes melhores do que eles mesmos. O crescimento só acontece nesse tipo de cenário.
Ofereça espaço, delegue projetos, compartilhe responsabilidades, mas nunca abandone o acompanhamento. No fundo, todo líder experiente carrega consigo alguma insegurança. Faz parte. O verdadeiro ganho está no fortalecimento da equipe, não no ego do gestor.
Como lidar com conflitos durante o processo?
Quando a liderança começa a se descentralizar, conflitos aparecem, é certo. E já enfrentei tantos… Na maioria das vezes, tratam-se de mal-entendidos, sobreposição de funções ou dois colaboradores querendo espaço ao mesmo tempo.
- Reconheça o conflito sem julgar
- Crie espaço para todos os envolvidos exporem seus pontos de vista
- Proponha soluções conjuntas, em vez de decisões impositivas
Já li sobre os diferentes papéis da liderança moderna neste artigo sobre os papéis indispensáveis para a liderança e concordo: resolver conflitos faz parte da rotina dos bons líderes.
E quando o clima pesa, manter a confiança e a energia do grupo é tarefa constante. Tenho convicção de que esse artigo sobre como manter a motivação da equipe em tempos difíceis traz pontos-chave.
Celebrando as novas lideranças e mantendo o ciclo
Se há algo que aprendi na prática é que reconhecer publicamente a ascensão de novos líderes traz efeito multiplicador. Não falo de festas ou aplausos, mas de simples gestos de valorização na rotina: um elogio espontâneo, destaque em reunião, ou até um e-mail coletivo. Sentir-se notado pelo grupo é combustível para qualquer novo líder.
Com o tempo, o ciclo se perpetua: líderes formam líderes, a cultura se fortalece, e os resultados aparecem. Mas o ponto de partida está em olhar cada colaborador como potencial protagonista. Alguns precisarão de incentivo extra, outros vão surpreender sem aviso. É assim mesmo. Faz parte do processo de desenvolvimento humano.
Reflexão final: todo dia é oportunidade de formar novos líderes
Compartilhei aqui impressões, aprendizados e erros acumulados em anos de trabalho. Não existe um único caminho, cada equipe é única, com limites e possibilidades próprios. Mas estou convencido de que liderança verdadeira nasce de relações baseadas em confiança, honestidade e vontade de crescer junto.
No fundo, formar líderes é como lançar sementes: parte vinga rápido, parte demora, algumas secam. Mas, quando florescem, renovam a energia do grupo de maneira inesperada. O desafio é diário, e acho que vale cada esforço.
Talvez, num olhar apressado, alguém veja apenas trabalhos e responsabilidades extras ao apostar na formação de lideranças internas. Mas quem sente a diferença do ambiente quando alguém cresce de verdade, nunca esquece. E, se você ainda não acompanha esse movimento de perto, está perdendo o que, para mim, é a experiência mais gratificante do mundo corporativo.


